sexta-feira, 14 de maio de 2010

Lugar à Esquerda

União Europeia?

por Mário Leston Bandeira*

Tendo passado 24 anos sobre a entrada de Portugal na CEE, em situação normal já seria tempo de se analisar criticamente os resultados dessa adesão e de se fazer um balanço político dos seus custos e benefícios.

Mas não estamos numa situação normal, porque Portugal e a maior parte dos seus parceiros da União Europeia estão a afundar-se numa situação cada vez mais grave. Comecemos então a fazer o balanço. Já chega de blá-blá europeu.

Na época da entrada na CEE, a intelligentzia portuguesa europeísta e a maioria da população aderiu, nalguns casos entusiasticamente, à ideia. Mas entre os entusiastas os motivos variavam.

Havia os que honestamente pensavam, e estavam no seu pleno direito, que Portugal beneficiaria com a sua integração num espaço economicamente próspero.
Mas os mais entusiastas seriam talvez os que esperavam ter oportunidades para fazer bons negócios e ganhar muito dinheiro, ou então para conseguir belos empregos na burocracia de Bruxelas.

Em alguns sectores, porventura mais lúcidos, alimentava-se talvez cinicamente a esperança de que, dada a indigência da vida política portuguesa e dos seus principais protagonistas e também o atraso cultural e o conservadorismo de grande parte da população portuguesa, a CEE “obrigaria” Portugal a modernizar-se e a atingir os padrões de vida e de desenvolvimento a que tinham chegado os nossos novos parceiros.

Dito de outra maneira: no entender dessas pessoas, provavelmente intelectuais cinicamente cépticos em relação ao futuro da mãe Pátria, era bom que viesse “alguém” de fora que fizesse por Portugal aquilo que os políticos, os patrões, os empresários e os banqueiros indígenas não conseguiam fazer. No fundo deles próprios, acreditavam nas virtualidades da estratégia da cenoura e do chicote, ou seja, a cenoura dos fundos estruturais e o chicote das leis, das regras e das ordens decididas em Bruxelas.

Com o passar do tempo, mesmo os nossos eurocépticos – o PCP e o PP do Manuel Monteiro – foram amolecendo, aderindo circunspectamente a um consenso nacional europeísta, o qual se reforçou com a entrada de Portugal no euro em 2002. O orgulho nacional de pertencer à UE já tinha, aliás, começado a subir em flecha com a aprovação em 2000 da Estratégia de Lisboa e atingiu o rubro com a recente assinatura do Tratado constitucional de Lisboa.

Pelo meio deste passar do tempo, até o primeiro-ministro Durão Barroso se deixou seduzir pela sereia de Bruxelas (não a de Copenhaga) e lá partiu ele para um belo emprego, deixando o país entregue ao Santana Lopes. Um golpe de génio.

Tem muitas histórias a história destes 24 anos de CEE/UE, como por exemplo as dos famosos fundos estruturais que, para além de terem contribuído para a construção de muitas auto-estradas, muitas delas desnecessárias, deram para muitas outras coisas, como por exemplo, arrasar com a agricultura, com as pescas, com as vias férreas e encher os bolsos de muito “boa” gente. Não vale a pena pormenorizar mais.

O texto já vai longo e o mais importante ainda não foi dito.

Em Março de 2000, o Conselho Europeu aprovou a chamada Estratégia de Lisboa que definia como principais objectivos da UE até 2010: promover o emprego e a coesão social através duma economia baseada no conhecimento.

Chegámos a 2010 e qual pode ser o balanço português destes nobres objectivos? A resposta é óbvia: desemprego, recessão económica, aumento das desigualdades e das discriminações sociais, aumento dos impostos, mais pobreza, mais corrupção.

E, como se não bastassem todas estas desgraças, confirmou-se politicamente durante o último fim-de-semana um facto que já era evidente desde há alguns anos: a supremacia dos países do Norte da Europa com a Alemanha à cabeça.
As ordens vêm do Norte e isso explica que o Primeiro-Ministro português tenha ido a Bruxelas no passado fim-de-semana receber guia de marcha: mais cortes, mais impostos, mais sacrifícios para os sacrificados do costume. Já estava tudo cozinhado em Bruxelas, o Governo português e o seu ministro das Finanças não precisaram de se chatear, não precisaram de fazer contas, o que, aliás, estaria para além das suas capacidades. Basta conferir os ziguezagues das previsões acerca do deficit que esses senhores foram papagueando desde o Verão passado, para se perceber que eles não conseguiram aprender a tabuada.

Há no meio de tudo o que tem vindo a acontecer um facto novo que me parece indesmentível: a chamada União Europeia já não existe. No lugar dela, temos agora, pelo menos três: a primeira, a que manda, que é a do Norte e outras duas, as que obedecem, que são do Sul e do Leste.

Esta nova tipologia ajuda-nos, aliás, a perceber que, sendo o Norte que comanda, é natural que a Irlanda, o Reino Unido e a Bélgica, cujas finanças também andam pelas ruas da amargura, sejam os países poupados pelo directório. Solidariedades puramente geográficas está-se mesmo a ver, nada disto tem nada a ver com racismo.

Quanto aos países do Sul, o dito directório chama-lhes PIGS (Portugal, Italy, Greece, Spain) e considera que são países incapazes de se governarem. Terão, não terão razão? Se calhar, já não temos a Europa connosco. Em que é que ficamos? À espera de Godot?

Se calhar o que é preciso é acordar.

Acordemos, não fiquemos em casa a ver televisão, não falemos só de futebol ou do vestido da vizinha ou do da colega de trabalho, não deixemos a política para os políticos e para os jornalistas, discutamos com quem aparecer, sejamos solidários, intervenientes. Sejamos capazes de lutar por causas, pondo em causa esta sociedade resignada, acomodada, em que às vezes parece que mesmo a desgraça do vizinho pouco importa.

Porquê acordar?

Quem nos garante que as desgraças alheias não vêm também bater à nossa porta?

* Professor Catedrático, Coordenador da Comissão Directiva

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