por António Pedro Dores*
Da minha distraída memória relativamente às discussões televisivas sobre a visita do Papa a Portugal fixei, talvez por terem sido particularmente vivas, as de Rebelo de Sousa – “explicando” como a Igreja está a ser vítima de uma cabala, pois “a pedofilia está em todo o lado” – e a de um conhecido fundamentalista a quem foi admitido, sem nenhuma reacção, afirmar que desde há dois mil anos a Igreja Católica defende a democracia.
Refiro-as aqui porque as declarações do Papa no avião que o trouxe de Itália apontam tais atitudes – com um conhecimento de causa e autoridade que escapam ao comum dos mortais – como as inimigas da Igreja. Disse ele, com razoável transparência e sem ambiguidades, que as cabalas contra a Igreja de que se fala vêm de dentro da Igreja, nomeadamente aqueles que pretendem ou continuar a ocultar os crimes ou, reconhecendo a sua irreversível visibilidade, pretendem impor o perdão aos culpados sem admitir a intervenção da justiça.
Aguarda-se, então, pela penitência destes nossos católicos militantes, justificando-se por serem mais papistas que o Papa, como costuma dizer-se, e afastando-se assim do estigma de serem parte da conspiração para destruir a própria Igreja a que dizem pertencer. Poderemos esperar pela intervenção de jornalistas do regime para esclarecer esta questão? Nomeadamente junto do Patriarca de Lisboa, cuja voz ambigua mais pareceu suportar os conspiradores do que a rara clareza papal, que os jornais espanhóis associaram à terceira professia de Fátima.
O certo é que antes da chegada do Papa o cartaz que me incomodou o passo e que deveria servir-lhe de boas vindas foi retirado. Serão já as forças de limpeza a actuar no seio da Igreja portuguesa?
*Sociólogo, membro da Comissão Directiva
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